Porque, há décadas, jornalistas processados por gente ligada a Sarney sempre perdem na Justiça?
Leandro Miranda, do Blog Marrapá, foi condenado agora por reproduzir matéria cujo autor nem foi processado; essa falha processual já anularia qualquer possibilidade de condenação
JM Cunha Santos
É qual um furúnculo no sovaco me perturbando há muito tempo. Como editorialista que fui, acompanhei uma sucessão de processos movidos por gente ligada ao senador José Sarney contra o Jornal Pequeno, seus diretores e jornalistas. Além, é claro, de outros órgãos de imprensa e profissionais alcançados pelo mesmo martelo judicial.
Era como marcar gol em time sem goleiro: a decisão prolatada era quase sempre favorável ao querelante. Na última de que tive conhecimento, o deputado Chiquinho Escórcio se gabava nos corredores da Assembleia de ter ganho na Justiça alguma coisa em torno de mais de R$ 100 mil do JP e alardeava isso como uma espécie de vingança contra o jornalista Lourival Bogea.
Com o fim da censura prévia no Brasil, a judicialização da imprensa se tornou o fuzil e o ferrolho na boca de muitos profissionais dispostos a denunciar corrupção e crime de colarinho branco no país. Eu mesmo fui processado seis vezes no espaço de menos de um mês pelo suplente familiar de senador Edinho Lobão no decorrer da campanha do hoje governador Flávio Dino. Meu apartamento mais parecia pista para teste de cooper de oficiais de Justiça que a residência de um pai de família. Era tanto oficial de Justiça que alguns vizinhos podiam até pensar que eu sou parente do Eduardo Cunha.
Junto comigo foram processados quase todos que ousavam desafiar o poder corrupto instalado à época no Maranhão: Gilberto Lima, Raimundo Garrone, John Cutrim, Leandro Miranda, dentre outros.
Da pauta de audiência do 1 Juizado Especial Criminal, Sessão do dia 6 de julho de 2017, (quinta-feira), constavam processos contra os jornalistas e blogueiros Aline Sousa dos Santos, (Página 2) Rafael Santos Câmara, Leandro Miranda (Blog Marrapá) Domingos de Jesus Costa, Cesar Bello e Luís Pablo Conceição Almeida, sendo que Leandro Miranda incurso em três dessas ações. Cinco dos processos são movidos pelo deputado Eduardo Braide, candidato derrotado nas últimas eleições municipais, e um pelo deputado Edilazio Júnior, que tem laços de parentesco irremovíveis na Justiça do Maranhão.
Os processos na época da campanha, quase todos eles, centralizavam-se no Tribunal Regional Eleitoral. Estes de agora são na Justiça Criminal, o que, por si só, já induz a ideia de provocar terror nos profissionais de imprensa ou o simples e perverso propósito de colocar jornalistas na cadeia. Pior que isso é a intimidade judicial dos processantes, um sendo advogado e outro sendo parente da Justiça. Sem contar a intimidade recursal, que o velho Sarney já demonstrou sobejamente ao cassar o mandato do ex-governador Jackson Lago e anular provas contra o filho, Fernando Sarney em instância superior.
O jornalista Leandro Miranda já foi condenado em um dos processos e por ter reproduzido matéria publicada em outro blog, por outro jornalista que nem chegou a ser processado. E é certo que essa simples falha processual já anularia qualquer possibilidade de condenação.
É compreensível que pessoas intimamente ligadas ao sarneisismo odeiem jornalistas e não consigam suportar a liberdade de imprensa. Afinal, na maior das vezes, são pessoas acusadas de crimes de corrupção pelo Ministério Público, investigadas pela Policia Federal e que não querem que ninguém saiba disso no Maranhão. O que não se entende são decisões como essa contra o jornalista Leandro Miranda, na contramão da história, num momento em que o mundo todo, inclusive o STF, defende a grandeza do papel da imprensa na intentona de acabar de vez com a corrupção que desgraça este país.
No Maranhão, até hoje, estranhamente, se a ação, cível ou penal, é contra jornalistas, o pessoal de Sarney nunca perde uma. É certo que o artigo 21 (Cap V) da Constituição Federal reza que “A vida privada da pessoa natural é inviolável, e o juiz, a requerimento do interessado, adotará as medidas para impedir ou fazer cessar ato contrário a esta norma”.
Mas desde quando corrupção é parte da vida privada?