Papete: o intérprete da música maranhense que trazia no bolso um colar e uma bola de meia
Quando o São João iniciava no mês de maio com os ensaios do Boi da Madre Deus e a catuaba do Diquinho e me dividia no mês de junho entre os arraiais da Santo Antônio e Apeadouro, o disco Bandeira de Aço gravado por Papete em 1978 compartilhava com as matracas e pandeirões a singularidade dos festejos juninos do Maranhão.
Essa sonoridade era a fogueira do nosso São João!
Bandeira de Aço foi o primeiro grande sucesso popular da música maranhense e um marco, embora já tivéssemos o Lances de Agora, de Chico Maranhão, por registrar pela primeira vez em disco os fundamentais compositores Josias Sobrinho, Ronaldo Mota, Sérgio Habibe e César Teixeira, autor da música que dá nome ao vinil, assinado na capa apenas como Carlos César.
Em uma época que o prêmio aos dez primeiros colocados nos festivais de música era a gravação de um disco, e o que aqui se produzia era consumido por poucos, o sucesso de Bandeira de Aço provocou polêmicas e brigas dos compositores com Papete por questões de direitos autorais e por ele levar a fama e o reconhecimento dos ludovicenses.
Embate que se reproduziu na década de 90, quando a Alumar o homenageou e aprofundou o fosso que os separava. Provocou até mesmo o meu afastamento da editoria do Caderno Impar, de O Imparcial, por tomar partido e publicar um manifesto dos artistas contra a multinacional, então a maior anunciante dos nossos matutinos.
Foi uma semana antes desse ocorrido que conheci Papete ao entrevistá-lo, por deveres de ofício, sobre mais essa polêmica e assim poder justificar uma outra matéria, desta vez com outro lado – essa sim do meu real interesse – publicada sete dias depois com o depoimento de César Nascimento, o que não evitou a ira dos donos do jornal e o meu desligamento da cobertura cultural.
Minha cara amarrada foi surpreendida pela simplicidade e uma certa singeleza daquele que levianamente classificava como oportunista.
Daí em diante comecei a vê-lo com outros olhos e respeito. O mesmo aconteceu, cada um a seu tempo, com os artistas envolvidos na peleja, inclusive César Texeira, que participou em maio de 2013 da emocionante homenagem aos 35 anos de Bandeira de Aço, show produzido pelo projeto BR 135 no Teatro Arthur Azevedo.
As felicitações de aniversário ainda incluíram um documentário com roteiro e direção do poeta Celso Borges, que você pode assistir logo abaixo.
Foi como percussionista que Papete alcançou fama internacional. Em 1982 ele foi citado pela revista norte-americana “Dow Beat” como um dos cinco melhores do mundo.
Por tudo isso é que posso dizer que a sua morte na madrugada desta quinta-feira aos 68 anos, depois de um árduo combate contra o câncer, não apagará a fogueira que ele acendeu e fez do São João uma bandeira de aço com olhos de papel de seda e uma estrela na testa; nos deixando para sempre com essa vontade louca de ver o dia nascer pela boca.
Parabéns pelo texto e pela contribuição cultural sobre a trajetória deste artista e a musica maranhense. Ainda que os proprios veiculos de comunicacao por aqui nao dêem a devida visibilidade aos artistas da Terra das Palmeiras, dedico minhas homenagens. Salve a musica maranhense! Salve, Papete! Vá em paz!