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  • ENTREVISTA

    Crise na Amazônia tem de ser ponto de inflexão para oposição brasileira, diz Noam Chomsky

    Patrícia Campos Mello
    SÃO PAULO

    A esquerda brasileira está apática e deveria se unir em torno da crise na Amazônia para fazer uma oposição real a Jair Bolsonaro.

    Para o linguista americano Noam Chomsky, 90, ícone da esquerda mundial e que está no Brasil, a esquerda de vários países abraçou o combate à mudança climática e a defesa do meio ambiente como formas de fazer oposição a líderes populistas de direita. 

    “O Brasil ainda não desenvolveu uma oposição [a Bolsonaro]. É preciso que a crise na Amazônia funcione como um ponto de inflexão para a oposição”, diz Chomsky.

    O linguista tem visitado o Brasil uma vez por ano, ao lado de sua mulher, a tradutora e pesquisadora em linguística Valéria Chomsky, que é carioca.

    Visitou o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na prisão, em Curitiba, reuniu-se com os então candidatos Fernando Haddad (PT) e Ciro Gomes (PDT) e se encontrou com o amigo Celso Amorim, ex-ministro das Relações Exteriores. 

    Desta vez, o acadêmico passou mais tempo descansando. Visitou Poços de Caldas, um de seus lugares favoritos no país, e comeu cupuaçu.

    Conhecido como “Elvis da Academia”, Chomsky não passou despercebido em São Paulo e foi abordado várias vezes nas ruas de Perdizes, bairro onde estava hospedado.

    Qual é a sua impressão sobre o Brasil hoje?

    Dez anos atrás, o Brasil era um dos países mais respeitados do mundo, e Lula era um dos principais estadistas no palco global. Agora, o Brasil virou motivo de chacota. Está se transformando em pária internacional e pode sofrer até boicotes por causa da Amazônia.  

    Como o senhor vê a estratégia de comunicação de Bolsonaro?

    Sua retórica é muito atraente para parte da população. Isso está ocorrendo no mundo todo. Nos EUA, [Donald] Trump é muito eficiente, sabe como deixar as multidões inflamadas e direcionar o ódio e o ressentimento das pessoas para bodes expiatórios. 

    Bolsonaro faz o mesmo. As políticas socioeconômicas adotadas nas últimas gerações, principalmente na era neoliberal, foram muito prejudiciais à grande maioria da população. 

    Nos EUA, houve crescimento, mas os salários reais dos americanos estão abaixo do que eram nos anos 1970. A concentração de riqueza tem um efeito imediato sobre o sistema político —uma das razões para o declínio da democracia na Europa e outros lugares

    Nos EUA, desde os democratas clintonianos, o partido vem se afastando da classe trabalhadora. O fato mais importante da eleição presidencial de 2016 foi o colapso de ambos os partidos —Bernie Sanders saiu do nada, não tinha recursos, a mídia o odiava, e quase ganhou a indicação.

    O Partido Republicano foi dominado por alguém que o establishment detestava. Estamos vendo o colapso das instituições de centro, por causa de raiva e ressentimento, que são explorados por demagogos como Trump, Bolsonaro, Matteo Salvini, Viktor Orbán.

    Mas há movimentos de resistência muito promissores. Na Europa, o DiEM25 [Movimento Democracia na Europa em 2025, para combater a mudança climática e gerar empregos] e o Extinction Rebellion [grupo internacional para evitar a extinção em massa devido às mudanças climáticas] tiveram muitas conquistas

    Nos EUA, há uma guinada para a esquerda entre os democratas. O Movimento Sunrise tem jovens que pressionam o Congresso, com muito ativismo direto, e que conseguiram algo inimaginável há alguns anos —fazer o Green New Deal entrar na agenda. 

    Do outro lado, temos o que Steve Bannon articulou de forma clara, um esforço para criar uma Internacional Reacionária liderada pela Casa Branca, e que inclui gente como as ditaduras do Golfo, como a Arábia Saudita, o país mais reacionário do mundo, Egito sob a ditadura de Abdul Fatah al-Sisi, Israel que migrou para a extrema-direita, [Narendra] Modi na Índia, Bolsonaro, Orbán, Salvini e Nigel Farage [defensor do brexit].

    Alguns argumentam que, se o Partido Democrata migrar demasiadamente para a esquerda, pode perder votos dos moderados…

    Sim, pode. Programas mais progressistas podem afastar alguns eleitores mais ricos e conservadores, e a mídia vai atacar sem trégua esses programas. 

    Aliás, não me surpreenderia se a eleição americana de 2020 for muito parecida com a brasileira de 2018, com onda massiva de propaganda enganosa transmitida em redes sociais. No Brasil foi absolutamente chocante, acho que nos EUA não chegaria a esse nível.

    Uso de dados e microdirecionamento, tudo isso será usado. Pode ser mais refinado nas próximas eleições, mas é muito tentador para ser ignorado pelos partidos.

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